(Foto: Daniel Pizamiglio)

Vivenciar escrevendo o projeto Crítica com a dança me faz retornar ao modo de nomear uma das ações do projeto: o encontro Conversas para Dançar.

Observo que as posturas críticas dessas conversas, que ocorreram ao longo de 2012, buscam tornar visíveis as condições de escrita dos textos críticos em dança. Essas condições podem ser acessadas como vivências a partir do momento em que se tem a oportunidade de exercitar ações no entorno do dançado. Ações que podem tornar a crítica como possível compreensão das experiências que circunstanciam obras de dança contemporânea.

Talvez na escrita de um texto crítico e, no exercício que ressignifica a experiência de sua leitura,  busque-se imparcialidade e certa distância do que se observa. Os critérios de observação podem ativar interpretações e modos de organizar perceptivamente o que uma obra de dança expõe: processo provisório dos textos e assuntos que engendra.

Há probabilidades que a atenção crítica torne impossível o afastamento do que se observa. Se pensarmos que a observação constitui-se como uma ação do corpo, os nexos de significação de uma obra podem ser vivências desse processo. Na medida em que se encontram modos de organizar a crítica com a dança, a ambiguidade torna presente a tentativa de classificar e nomear experiências, podendo ser o ponto de divergência entre aquilo que se observa e se vivencia.

Dos encontros do projeto em suas itinerâncias (encontros de itinerância, como define Joubert), percebe-se certa impossibilidade de afastar a crítica da experiência da dança. Os deslocamentos foram de encontro às obras articulando modos possíveis de relacionar o projeto com as ações que o compõe.

Com uma zona territorial escolhida como campo de ações: o Nordeste do Brasil, o projeto expande ações no encontro com pessoas. Suas possibilidades de acontecimento são marcadas pelos trânsitos que compõe encontros. Assim, o projeto “Crítica com a Dança” vai se exercitando como um campo de ações em território aberto, que demarca encontros no trânsito das experiências em dança com os ambientes que as posicionam.

AJEITAR A PALAVRA?!

Chamo atenção para a ação coreográfica compartilhada na conversa para dançar realizada no Sobrado Dr. José Lourenço em Fortaleza. Como modo de comunicar a dificuldade de encontrar palavras adequadas para compor os textos críticos em dança, realizei o Estudo da materialidade das palavras. Esse estudo consiste na coleta de materiais em ambientes internos e externos que são usados na escrita de palavras espalhadas no espaço de compartilhamento da ação coreográfica.

A proposição é tornar visível algumas palavrasínteses que permitem a aproximação dos modos de perceber o movimento da escrita que se compõe com materiais que podem ser vistos no entorno externo/interno do ambiente de exposição da ação. No caso de Fortaleza, usei sementes vermelhas de pau-brasil, tecido, côco verde vazio e sem água, pedrinhas do paralelepípedo da rua, folhas grandes de amendoeira, pedacinhos de fita-que-gruda branca e folhas de papel de revistas velhas do Sobrado.

Nesse lugar do centro da capital cearense, próximo ao Passeio Público, chamei a disposição para a escrita da palavra “escrita” com pequenas pedrinhas da rua. Por estar em um lugar de passagem do Sobrado a palavra foi chutada diversas vezes, até que um moço funcionário do espaço me disse o seguinte:

 

– A escrita está sendo chutada, mas não se preocupe que vou ajeitar a palavra!

 

E assim ajeitou diversas vezes até abandonar, o que me faz retornar ao início desse manuscrito, na preocupação com as condições de escrita dos textos críticos em dança. Questiono-me se o exercício de se posicionar criticamente pode ser texto que se permite ressignificar nos modos que as obras de dança contemporânea comunicam suas possibilidades de existir.

Proponho a percepção avessa da crítica, aquilo que permite acionar a palavra “crítica” transformando a possibilidade de seu encontro com a dança. Como conversa os modos de relação da crítica com a dança podem ser escritas constantes de ações que compõe. Conversar possibilita o exercício da crítica com a dança posicionando volumes circundantes a essas palavras, movimentos que dançam sua percepção escrita.

Candice Didonet é artista e pesquisadora. Mestre e Especialista em Dança pela Universidade Federal da Bahia e Bacharel em Comunicação das Artes do Corpo pela PUC/São Paulo. Integrou o projeto Crítica com a Dança 2012 como artista e pesquisadora colaboradora. 

 

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