O animal sendo animal. Cada espécie com suas margens de manobra. Um tigre sendo tigre. Um cavalo sendo cavalo. Uma arara sendo arara. Um golfinho sendo golfinho. Cada um é uma possibilidade e cada espécie, uma comunidade política. Com interesses, com objetivos. Os humanos, a dita espécie humana, deveriam ser humanos, mas quase sempre não o são.
Quando nascemos, somos bichos. Bichos humanos que se tornaram humanos não bichos. Perdemos a conexão com a natureza. Fazemos política antes mesmo de tomarmos partido. Fazemos política quando tomamos consciência. Pois a política não se limita aos ditos partidos políticos, nem as eleições, sessões parlamentares etc.
Quando nascemos, a brincadeira é aprendizado. Brincamos, ludicamente. Cérebro a mil. Cada gesto, cada movimento, é uma descoberta e, ao mesmo tempo, um encontro. O corpo vai aprendendo na curiosidade e, nesse aprender, está treinando, sem nem se dar conta. Histórias de traquinagem quando ainda éramos pequeninos, mais ou menos, com 1 ou 2 anos, e não 3 ou 4, dizem muito desse brincar-treinar.
Gostava de escalar tudo que via como mais alto do que eu. Gostava também quando minha mãe me colocava numa bacia para eu fazem aquela aguança. Corria pra tudo que é lado, mesmo sem nem saber como andar. Não perdia de perspectiva que eu precisava das pessoas maiores do que eu, mas também escapava dessa vigilância ou opressão da proporcionalidade. Quando não deixavam eu brincar traquinando, eu ficava com muita raiva. Parecia que virava bicho, mas não.
Bicho eu já era. Bicho humano.
Humano humano inacabado que acabou de nascer.
E eu não estava sozinho. Tinha minha irmã, mais velha que eu, um ano e dois meses. A proximidade de idade nos dava certa cumplicidade, mas as personalidades faziam-nos extremos. Brincávamos juntos mas, de uma hora pra outra, estávamos fazendo coisas que eram desafiantes pra um e não pro outro, não pra outra.
Tínhamos responsabilidades já desde pequeno. Pequeninos. Nos aventurávamos nessas manobras de fazer algo que queríamos e algo que queriam que fizéssemos. Mesmo sem eloquência na fala, tínhamos eloquência no mover, tentar andar, experimentar correr, tudo junto, os dois meio que encangados.
A política dos irmãos. Há política entre irmãos. Fazemos política com os irmãos. Uma menina faz política, diferente da política que faz o menino. A menina primogênita, não o menino. O menino que veio depois, mas que era visto como menina. A sorte é que vivíamos na Serra da Ibiapaba, onde haviam muitos espaços circundantes para experimentarmos.
É que todo bebê, sendo humano ou não humano, sendo bicho ou não bicho, é muito, mas muito traquina: aquele ou aquilo que faz algo que parece travessura, surto, pequenos e inocentes delitos… ou seja, despirocado, travesso, espoleta. Por quê?
Porque deseja conhecer e só conhecemos se nos movemos.
O conhecimento é político porque é da ordem do conhecimento.
Então o que os animais não humanos nos ensinam sobre política?
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