A história recente da dança contemporânea cearense tem muitos nomes que, coevolutivamente, estão relacionados com contextos específicos, como o final dos anos 90 e início do novo século. Nesse período, foi criado o Colégio de Dança do Ceará (1999) e também foi realizada a primeira edição da Bienal Internacional de Dança do Ceará (1997).
Marina Carleial é um desses nomes e seu retorno com um espetáculo é mais que benvindo. É sintomático, pois revela um nomadismo de muitos criadores cearenses de dança nos últimos cinco anos. Alguns deles foram e não voltaram. Ela decidiu voltar e partilha as andanças que têm vivido fora do Ceará/Brasil na obra Compartir, em cartaz no Projeto Quinta com Dança de julho, no Teatro do Centro Dragão do mar, com apoio da Secretaria de Cultura do Estado do Ceará.
Nesse movimento, importante falar um pouco da sua trajetória. Marina inicia seus estudos em dança clássica, em Fortaleza em 1989. Realiza a formação técnica em dança pelo Colégio de Dança do Ceará (2001-2002). Participa como bailarina do I Ateliê de Coreógrafos Brasileiros, em Salvador/BA, no ano de 2002. No ano seguinte, propõe o espetáculo Música para as Rosas, em parceria com Janahína Santos (atualmente na Cia. Viladança, Salvador/BA) e trabalha com o Projeto de Extensão Vixe! Grupo de Dança, pelo curso de Psicologia da Universidade Federal do Ceará – UFC. Realiza residência coreográfica com Rachid Ouramdane (FRA) e produz o espetáculo Limites no ano de 2004. Dois anos depois, forma-se em Estilismo e Moda pela UFC.
Agora, numa breve e necessária conversa via internet, Marina reflete sobre seu momento atual, a partir de algumas boas provocações críticas:
O que de mais interessante você conheceu nesse nomadismo pelo México no que se refere à chamada dança contemporânea mundial?
Eu estive no México por um ano e meio, na Cidade do México, um lugar enorme e cheio de informação. Lá, na Universidad Autónoma de México (UNAM), fiz aulas na Cia. Danza Libre e workshop de dança contemporânea. Foram experiências com danças mais técnicas e menos conceituais.
Também tive aulas com Edgar Robles no Centro Nacional de Las Artes (CNA) de uma técnica muito interessante chamada Leeder com influência americana. E foi lá no México que assisti a Cia. José Limón e participei do Encuentro Internacional de Investigación de la Danza José Limón como palestrante (desenvolvi uma fala sobre figurino). Foi lá que conheci a revista DCO (Danza Cuerpo y Obsesión) e publiquei um artigo também sobre figurino.
Assim que, a partir das seqüências de aulas que estava praticando, apresentei uma partitura coreográfica dentro de um projeto do Centro Nacional de las Artes : Diálogo de percepciones sobre el proceso creador, junto com outros coreógrafos mexicanos.
Também conheci o Encuentro Internacional Mirar adentro y afuera de la danza. Foi também no México que cursei um diplomado em Arte mexicana e um curso em Arte latino americana.
E na Europa? O que te mobilizou por lá?
Na Europa, fui como turista, mas depois morei na Holanda. Lá fiz aulas na Henny Jurriëns Foundation Amsterdam. Assisti muitos trabalhos de coreógrafos importantes como Jerome Bell, Anne Theresa e Wiliam Forsythe. Participei do encontro ICKA Amsterdan e conheci o japonês Akira Hino.
Aliás, estar na Holanda, foi um grande aprendizado de vida e uma sensação de ver a história ao vivo. Lá a dança é profissional. Vejo isso nas relações entre aluno e professor, entre público e artista, entre os próprios artistas. As pessoas percebem a arte como forma de vida, estudo e trabalho.
Nesse sentido, como tuas investigações de corpo se transformaram?
Não só as informações de dança influenciaram, mas também das artes, quantos museus, quantos artistas novos! O corpo sente isso. Os encontros nos modificam, nos fazem pensar de outras maneiras. Sentia a necessidade de entender meu comportamento dentro de outras situações, outros lugares. Um grande fator para as transformações nas investigações foram as informações que chegaram até mim. Leituras, pessoas, aulas, espetáculos. Tudo isso modifica nosso discurso corporal.
No entanto, o que mudou principalmente foi a maneira de ver a arte: com um ângulo mais aberto, com uma lente que oferece mais detalhes. Acredito que quanto mais experiências vivenciamos, mais cheio fica nosso discurso, mais completo e interessante porque se torna mais complexo.
A tua experiência formativa passa pela moda, já que se graduou nessa área e, com ela, vem investigando tua dança. Onde você situa, então, a dança nessa discussão? Quero dizer, moda é arte? Figurino é corpo?
A moda pode ser arte sim, mas também pode ser comércio. Sobre o figurino, acho que eu o situo mais como informação. Para mim, dentro da minha formação, coloco um paralelo entre moda e dança através do figurino. É uma maneira nova de atuar na cena. Mais uma possibilidade de interferir, propor, contribuir e criar. Mais um exercício de criatividade e superação.
Como você definiria esse seu retorno à Fortaleza, em especial, com uma obra artística?
Como definir “voltar pra casa”? É uma sensação de pertença muito grande misturado com um estranhamento das mudanças que aconteceram no período passado fora. É perceber outra vez o lugar de onde viemos. A obra (Compartir) começou na Cidade do México. Na Holanda, a obra descansou um pouco. Quando cheguei eu queria fazer dança. Estar aqui de corpo e arte. Simplesmente, existia uma grande vontade de dançar e de pensar como poderia ser um discurso dançado a partir de minhas vivências nestes últimos anos.
Escolha uma imagem, sua ou da internet, que sintetize, circunstancialmente, seus interesses em dança atualmente.
Nesse momento, estou imersa nesse novo processo, assim que acho mais coerente a foto abaixo, de Tiagos Lopes, sobre o trabalho Compartir.
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