Bailarina epilética vai induzir ataque no palco: arte ou excentricidade?

O Arts Council pagou a uma bailarina epiléptica 13.889 mil libras – cerca de 15 mil euros, cerca de 40 mil reais – para que ela suspendesse a sua medicação e tivesse um ataque em cena. O espectáculo tem em vista o estudo dos “interfaces físicos entre a dança, o movimento e a epilepsia”

Segundo o diário britânico “The Times”, a actuação de 24 horas de Rita Marcalo, que implica que a bailarina fique sem dormir durante esse tempo, tem em vista o estudo dos “interfaces físicos entre a dança, o movimento e a epilepsia”.

As organizações de apoio à epilepsia disseram que o acontecimento torna uma condição de saúde mal-entendida num espectáculo excêntrico e alertou para os potenciais perigos de parar com a medicação para o tratamento da epilepsia.

Marcalo referiu que queria aumentar a consciencialização da epilepsia como uma “doença invisível” e que usará a actuação do próximo mês, apenas para adultos, no teatro The Bradford Playhouse, em Inglaterra, para explorar a sua “outra identidade como pessoa doente”.

A bailarina, directora artística da companhia de dança Instant Dissidence, com sede na cidade inglesa de Leeds, é epiléptica desde os 17 anos. Marcalo deixou de tomar os seus medicamentos na semana passada e por 24 horas, a partir da uma da manhã do dia 11 de Dezembro, os espectadores poderão ver as suas tentativas de ter um ataque em palco.

Assim, haverá o recurso, no espectáculo, a luzes estroboscópicas, programas informáticos específicos, a bailarina terá de fazer jejum, privar-se de dormir, tomar estimulantes da actividade cerebral, como o álcool e o tabaco, e será elevada, artificialmente, a sua temperatura corporal.

As actuações de outros artistas, em termos de dança e de instalações, entreterão os espectadores enquanto esperam que Marcalo tenha um ataque epiléptico.

O Playhouse diz, “num determinado momento da actuação, Marcalo poderá sofrer um ataque epiléptico. Quando este ocorrer, soará um alarme, as luzes aumentarão de intensidade, a música parará e uma série de câmaras gravará o ataque. Os espectadores serão encorajados a gravar essas imagens nos seus telemóveis”.

O Arts Council England justificou a sua decisão de pagar a Marcalo para a realização deste espectáculo afirmando que ela é uma “artista importante cujo trabalho merece ser visto”. Um porta-voz disse que esta organização, dedicada às artes, tinha tido um conselho médico e que o “apoio médico apropriado” estava disponível.

Sallie Baxendale, neuropsicóloga na National Society for Epilepsy, disse que “o ponto positivo é que as pessoas vão falar mais da epilepsia, mas o negativo é que esta doença irá ser apresentada num espectáculo excêntrico em vez de ensinar as pessoas sobre as convulsões epilépticas.

O perigo de parar de tomar a medicação é equivalente, por vezes, àquele quando se está num nível em que não se controlam as convulsões. Joga-se com a medicação para próprio perigo da pessoa.

Fonte: www.publico.clix.pt (20/11/2009)

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2 Comentários

  1. Maurileni Moreira

    Joubert, há muito tempo que não visito seu blog, suas linhas, suas danças… Saudades, meu querido amigo. Aqui, sim, muitas epifanias e alguns desejos de desistencias. Mas, novamente, decidi resisti, permanecer, estar e se fazer necessária nas coisas nossas daqui de Fortaleza. Tivemos recentemente um módulo de Crítica de Dança com Thaís Gonçalves, muito bom por sinal, está me rendendo mais outros pensamentos valorativos de ideias atuantes por aqui. Apesar de estar me sentindo as fezes do Rin-tin-tin… O que ocasiona em mim, além de ser merda, ser merda-fantasma-imaginativa-ilusória… Risos espalhafatosos! Fiquei perplexa com esta sua postagem da bailarina epiléptica. Causou em mim uma sensação ruim, talvez seja pelo fato de ter saido recentemente da Santa Casa de Misericóridia (familiares doentes), e essa relação limiar com a vida e a morte; saúde e doença; dança e realidade me dá um sei o quê de pensamento vazio… Parece um excesso! Eu queria saber mais aonde que se querem chegar com estas “experiências”, como se movimentar e assistir um espetáculo onde em algum momento um ataque epiléptico se tornará espetáculo? Será que há um afastamento real entre o fazer e o assistir… Sei não, creio que eu preferia não ver, creio que pensando assim de imediato eu não concordo pondo alguém em risco assim… aI… Há quantas andas esta história?!

    Abraços, meu querido! Muitos abraços e obrigada pelas palavras carinhosas e epifanicas. Vou agora para a segunda parte do vídeo. O que antecede esta postagem.

    rsrrs

    Maurileni Moreira.

  2. Oi Mauri

    Este espetáculo com a bailarina epilética não foi apresentado aqui em Lisboa. A polemica, no entanto, tem rendido mais audiencia, hehehe. A questão fica no limiar entre o artistico e o social. Se quer alertar para os preconceitos contra as pessoas epiléticas, há outras maneiras mais eficientes em termos de diálogo. Mas se quer pesquisar o assunto artisticamente, há de haver algum processo de investigação e não simplesmente ir lá e ter um ataque em palco. Acho preguiçoso. O detalhe é a que se propõe… Nesse sentido digo que não desistas. Resitëncia é a palavra-chave para se fazer arte e, claro, fazendo os acordos necessários para sobreviver, permanecer, continuar. E fico feliz que a continuação do módulo de crítica tenha sido proveitoso. Bom que vcs tiveram duas pessoas falando a partir do mesmo tema, ai os horizontes ficam menos distantes…bjo.

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